Um instrumento de desenvolvimento regional com impacto nacional
Os Fundos Constitucionais de Financiamento (FNO – Fundo Constitucional de Financiamento do Norte; FNE — Fundo Constitucional de Financiamento do Nordeste; e FCO – Fundo Constitucional de Financiamento do Centro-Oeste) nasceram da Constituição de 1988 (art. 159, I, “c”) e foram regulamentados pela Lei nº 7.827/1989. Sua finalidade é clara: reduzir desigualdades regionais e apoiar o desenvolvimento econômico e social das regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste, por meio de crédito em condições diferenciadas. Cada fundo é administrado por um banco federal regional — o Banco da Amazônia (FNO), o Banco do Nordeste (FNE) e o Banco do Brasil (FCO) — e recebe parcela da arrecadação de IR e IPI, complementada por retornos e dotações orçamentárias.
Esses recursos, que somam dezenas de bilhões de reais por exercício, são alocados em setores produtivos estratégicos: agropecuária, indústria, infraestrutura, comércio, serviços e inovação. Ao longo de 2023-2025, os três fundos já superaram R$ 160 bilhões em contratações, com destaque para linhas do Plano Safra e para infraestrutura regional. Trata-se, portanto, de uma das maiores fontes públicas de crédito de longo prazo no Brasil.
O papel das Superintendências (Sudam, Sudene e Sudeco)
Um aspecto muitas vezes pouco lembrado é que os Fundos Constitucionais não são apenas instrumentos financeiros: eles fazem parte de uma engrenagem institucional mais ampla, que envolve as superintendências de desenvolvimento regional.
- SUDAM (Superintendência do Desenvolvimento da Amazônia) é responsável pelo planejamento estratégico do FNO, alinhado ao Plano Regional de Desenvolvimento da Amazônia (PRDA). Embora o Banco da Amazônia seja o operador do fundo, a Sudam define diretrizes, acompanha a execução e articula as prioridades junto aos estados da região Norte.
- SUDENE (Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste) desempenha papel equivalente no caso do FNE, alinhando os financiamentos às estratégias do Plano Regional de Desenvolvimento do Nordeste (PRDNE). É a Sudene que, em articulação com governos estaduais e empresariado, define os eixos prioritários de aplicação dos recursos do fundo na região.
- SUDECO (Superintendência do Desenvolvimento do Centro-Oeste) cumpre essa função no FCO, elaborando a Programação Anual de Financiamento e coordenando o Condel/Sudeco, que aprova resoluções com tetos, prioridades e listas de itens não financiáveis. O Banco do Brasil, por sua vez, operacionaliza os financiamentos.
Em resumo: as superintendências são as gestoras estratégicas dos fundos, responsáveis por planejar, normatizar e acompanhar o uso dos recursos, enquanto os bancos federais são os operadores financeiros. Para a BIDS, isso significa que a negociação política e institucional com essas superintendências é tão ou mais importante do que a relação direta com os bancos operadores.
Defesa e segurança: espaço de elegibilidade e limites explícitos
Uma dúvida recorrente da Base Industrial de Defesa e Segurança (BIDS) é: “posso acessar recursos desses fundos para projetos de defesa e segurança?”. A resposta é sim — mas com ressalvas importantes. Os regulamentos de cada fundo trazem listas de itens financiáveis e não financiáveis.
No FNO, a regra é taxativa: não se financia a fabricação ou comercialização de armas leves e pesadas, nem de munições. Contudo, o mesmo documento abre espaço para “demais segmentos da Indústria de Defesa”, desde que em conformidade com o Livro Branco de Defesa Nacional. Isso significa que sensores, comunicações seguras, MRO de meios, softwares de comando e controle, sistemas espaciais, cibersegurança e robótica dual-use podem ser elegíveis, enquanto armamentos permanecem vedados.
No FCO, a Programação Anual mantém um capítulo de “itens não financiáveis”. A tradição normativa do Conselho Deliberativo da Sudeco é clara: a comercialização de armas está excluída. Porém, a indústria de defesa não armamentária é admitida, cabendo aos conselhos estaduais definir prioridades adicionais. Assim, projetos de veículos especiais sem armas, centros de comando e integração, infraestrutura de comunicações e cibersegurança encontram espaço dentro das linhas do FCO.
Já o FNE não traz uma cláusula geral única, mas em diversas linhas setoriais há exclusões específicas para armas, munições e equipamentos bélicos. O Banco do Nordeste tem priorizado inovação, digitalização, infraestrutura crítica e sustentabilidade, o que abre margem para projetos de defesa dual-use: satélites, softwares de segurança pública, integração de sistemas de monitoramento, manutenção industrial e soluções de inteligência artificial.
Exemplos práticos de elegibilidades aplicáveis ao setor de Defesa & Segurança
Para tornar mais clara a aplicação dos Fundos Constitucionais no contexto da Base Industrial de Defesa e Segurança, é importante observar como determinadas atividades econômicas, identificadas por códigos CNAE ou NCM, se enquadram nas diretrizes de cada fundo. Embora armas e munições estejam fora do escopo, há um conjunto amplo de setores tecnológicos, industriais e de serviços vinculados à defesa que podem acessar esses recursos. A seguir, alguns exemplos ilustrativos de áreas com potencial de enquadramento.
- CNAE 26.xx (eletrônicos, ópticos, comunicações): sensores, radares civis, enlaces seguros e componentes ópticos são elegíveis, desde que desvinculados de armamento.
- CNAE 62/63 (TI, cibersegurança, IA): desenvolvimento de softwares de C2, centros de operações cibernéticas, analytics aplicados à segurança pública e defesa civil.
- CNAE 33.14/33.29 (manutenção, reparação e instalação): MRO de aeronaves, viaturas e embarcações sem armamento embarcado.
- CNAE 28/30 (máquinas e veículos especiais): drones para inspeção ambiental, UGVs para logística e veículos especiais dual-use.
- Espaço & satcom: constelações de nanosats para monitoramento do semiárido, estações terrenas regionais e soluções de geoinformação.
Em todos os casos, o cuidado central é “desarmar” o escopo: se o projeto incluir qualquer item de arma ou munição, deve-se separar esse componente, sob pena de inviabilizar o financiamento.
Conclusão: uma porta aberta para a BIDS, desde que bem estruturada
Os Fundos Constitucionais oferecem oportunidades reais para a BIDS brasileira, sobretudo em segmentos de alta tecnologia, infraestrutura crítica, cibersegurança, espaço, robótica e manutenção. O acesso, entretanto, exige atenção ao compliance: eliminar itens de armamento, alinhar projetos às políticas regionais (PNDR, PRDNE, diretrizes da Sudeco e Sudene) e utilizar o Livro Branco de Defesa Nacional como âncora.
Com essa estratégia, empresas da BIDS podem transformar os Fundos Constitucionais em instrumentos de financiamento de longo prazo, fortalecendo sua competitividade e ampliando sua inserção em cadeias produtivas estratégicas — sem esbarrar nas restrições legais.

Um Guia Completo para Empresários, Industriais e Profissionais da Base Industrial de Defesa & Segurança Brasileira
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