O Reino Unido anunciou, nos últimos dias, o “UK Strategic Defence Review 2025“, uma das mais ambiciosas revisões estratégicas de defesa de sua história recente, em um contexto geopolítico caracterizado por reações à crescente instabilidade na Europa Oriental, ao reposicionamento das potências asiáticas e ao ressurgimento de ameaças não convencionais no âmbito cibernético.
Os pilares do novo plano britânico de defesa
Com foco na modernização das Forças Armadas, na dissuasão nuclear e na preparação para conflitos de alta intensidade, o documento reforça a intenção britânica de manter um papel de protagonismo estratégico global, alinhado com seus compromissos na OTAN e com os desafios do século XXI.
Desta forma, o conjunto de iniciativas contidas no pacote anunciado pelo governo britânico prevê investimentos vultosos em cinco frentes prioritárias:
- Substituição da frota de submarinos nucleares de ataque: até 12 novas embarcações serão construídas ao longo da próxima década, substituindo os atuais modelos da classe Astute. Essa renovação é fundamental para manter a capacidade de dissuasão e projeção britânica em contextos de conflito naval e estratégico.
- Nova geração de ogivas nucleares: com aporte de £15 bilhões, o Reino Unido irá desenvolver um novo sistema de ogivas nucleares, com tecnologias mais seguras, eficazes e compatíveis com os padrões da OTAN.
- Produção interna e contínua de armamentos: serão construídas seis novas fábricas de munição e armamentos, com investimento direto de £1,5 bilhão, buscando reduzir dependências externas e garantir autonomia logística em cenários de guerra prolongada.
- Capacidades tecnológicas emergentes: aquisição de 7.000 mísseis de longo alcance e desenvolvimento de sistemas de armamentos baseados em Inteligência Artificial, drones e armamentos a laser estão entre as prioridades, alinhadas às novas doutrinas da guerra multidomínio.
- Domínio cibernético e eletromagnético: está prevista a criação de um Comando Cibernético e Eletromagnético ainda em 2025, voltado para operações ofensivas e defensivas em ambientes digitais e de comunicações.
Impactos imediatos nos mercados e na indústria de defesa
Como era de se esperar, a resposta do mercado financeiro à Revisão Estratégica foi rápida e expressiva. As principais empresas britânicas do setor de defesa registraram valorizações significativas:
- BAE Systems: maior grupo de defesa da Europa, teve alta de aproximadamente 12% em suas ações na semana do anúncio, impulsionada pela expectativa de novos contratos navais, cibernéticos e aeroespaciais.
- Rolls-Royce Defense: com forte presença na propulsão naval e aeronáutica, teve alta de 9%, beneficiada pela demanda crescente por sistemas de energia nuclear e motores para caças.
- Babcock International: especializada em engenharia naval, suporte logístico e gerenciamento de frota, viu suas ações saltarem mais de 15%, especialmente pela expectativa de participação na produção dos novos submarinos.
Esse movimento também alavancou outras empresas do setor aeroespacial, cibernético e de sensores militares, criando um ciclo virtuoso de crescimento, geração de empregos e fortalecimento da soberania tecnológica.
Lições para o Brasil e sua BIDS
A iniciativa britânica oferece lições valiosas para o Brasil, especialmente no momento em que o país busca consolidar sua Base Industrial de Defesa e Segurança (BIDS):
- Planejamento de longo prazo: o Reino Unido demonstra clareza estratégica ao projetar investimentos de décadas, sinalizando para o mercado a estabilidade e previsibilidade necessárias para atração de capitais e desenvolvimento de tecnologias sensíveis.
- Integração entre defesa e indústria: a indústria britânica não apenas executa projetos militares, mas também participa da formulação estratégica, garantindo que as políticas públicas gerem externalidades positivas para o crescimento econômico e inovação.
- Capacitação e soberania tecnológica: é urgente que o Brasil invista em setores como cibernética, munição inteligente, propulsão nuclear e armamentos de nova geração, sob risco de tornar-se irrelevante no xadrez geoestratégico.
- Estímulo a financiamentos e fundos estratégicos: a valorização das empresas de defesa britânicas aponta para a viabilidade de criação de fundos setoriais no Brasil, com foco em dual use, soberania produtiva e exportação de sistemas complexos.
Conclusão
O exemplo britânico deixa claro: não se trata apenas de investir em equipamentos, mas de organizar todo um ecossistema de defesa e segurança com racionalidade financeira, foco industrial e visão de longo prazo. Os cinco pilares estabelecidos pela Revisão Estratégica de Defesa 2025 mostram uma abordagem integrada e proativa, capaz de responder às ameaças do presente sem comprometer a capacidade de dissuasão futura.
Ao combinar dissuasão nuclear, produção autônoma, inovação tecnológica e dominação cibernética, o Reino Unido sinaliza que a soberania nacional passa, cada vez mais, pela capacidade de antever e moldar cenários de conflito.
Ao Brasil cabe refletir sobre como alinhar seus instrumentos de defesa às exigências desse novo paradigma, sob pena de ver sua BIDS marginalizada num mundo que privilegia soberania produtiva, inteligência estratégica e agilidade tecnológica.
Fontes consultadas
- Governo do Reino Unido. “The Strategic Defence Review 2025: Making Britain Safer, Secure at Home, Strong Abroad“.
- The Times (Reino Unido). “Babcock, BAE and Rolls-Royce shares boosted by £15bn defence pledge“.
- The Wall Street Journal. “U.K. to Strengthen Nuclear Deterrence Under New Defense Strategy“.
- The Economic Times. “Europe doubling down on defence spending after being snubbed during US-Russia talks: Benjamin Heelan“.
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