Orçamento Público Federal: porque “dotação orçamentária” não é “disponibilidade financeira”?

Como sabemos, ter uma disponibilidade de crédito no Orçamento Público Federal brasileiro não se reflete, necessariamente, em se ter uma disponibilidade financeira efetiva e imediata. Dito de outra forma, quanto um ente da Administração Pública afirma que tem R$ 10 milhões de “crédito orçamentário” não significa, necessariamente, que ele já possui, de fato, R$ 10 milhões em dinheiro (numerário) disponível. Mas, por que isso acontece?

A principal finalidade do Orçamento Público Federal é servir como um instrumento de planejamento e controle das finanças públicas. Ele permite que o governo organize suas atividades, priorize gastos e aloque recursos para diferentes áreas, como saúde, educação, defesa e infraestrutura. Além disso, o orçamento é uma ferramenta de transparência e accountability (rastreabilidade de responsabilidades), permitindo que o público e os órgãos de controle fiscalizem a utilização dos recursos públicos.

Nesse sentido, então, o Orçamento Público Federal brasileiro nada mais é do que um planejamento oficial em que se projetam o volume de receitas que serão obtidas por meio de impostos e afins, bem como se fixam as despesas do governo federal para um ano fiscal específico.

Ele é elaborado com base em três principais instrumentos: o Plano Plurianual (PPA); a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO); e a Lei Orçamentária Anual (LOA). O orçamento é aprovado pelo Congresso Nacional e sancionado pelo Presidente da República.

Em que pese se falar muito na mídia sobre LOA, LDO e PPA, a verdade é que poucos comentaristas, analistas ou mesmo empresários, sabem quais as relações entre esses documentos. De fato, estes são instrumentos fundamentais para a gestão fiscal e orçamentária e, de forma sintética, estão interligados da seguinte forma:

  1. PPA (Plano Plurianual): Este é o planejamento de médio prazo do governo, geralmente com duração de quatro anos. O PPA estabelece as diretrizes, objetivos e metas da administração pública federal, incluindo as despesas de capital para o período.
  2. LDO (Lei de Diretrizes Orçamentárias): Este instrumento serve como uma ponte entre o PPA e a LOA. A LDO é elaborada anualmente e orienta a elaboração dos orçamentos anuais, de acordo com as metas e prioridades estabelecidas no PPA. Ela também estabelece as metas fiscais e as regras que deverão orientar a LOA.
  3. LOA (Lei Orçamentária Anual): Este é o orçamento propriamente dito, elaborado anualmente. A LOA detalha todas as receitas e despesas do governo para o ano seguinte, em conformidade com as diretrizes estabelecidas pela LDO e as metas de médio prazo definidas no PPA.

Resumidamente, então, temos que o PPA define o planejamento de médio prazo, a LDO estabelece as diretrizes para o orçamento anual, e a LOA autoriza, ao menos em princípio, a execução do orçamento anual dentro das diretrizes e metas estabelecidas pelos dois instrumentos anteriores.

Conforme apresentado acima, o Orçamento Público Federal brasileiro é um documento oficial que contém um “plano” de alocação de recursos onde se estimam as receitas e fixam-se as despesas previstas para um determinado período, geralmente um ano.

Todavia, como se pode imaginar, tanto pela ótica das receitas, quanto pela ótica das despesas, o Orçamento, mesmo após sua aprovação, é muito mais uma “carta de intenções” do que qualquer outra coisa. Afinal, as receitas dependem, majoritariamente, de arrecadação (e.g. impostos, tributos, taxas, etc.) e as despesas, por sua vez, dependem da resultante dos diversos vetores de “demandas políticas”, mormente oriundos dos níveis federal, estadual e municipal.

Diante desse contexto, começa-se a entender porque o orçamento não é uma garantia de disponibilidade financeira. Afinal, como se observa, há um evidente descompasso sistêmico entre as dimensões orçamentária e financeira. Nesse sentido, algumas das principais razões para esse descompasso podem ser elencadas como se segue:

  1. Arrecadação de Receitas: A previsão de receitas no orçamento é, como já dito, somente uma estimativa. Se a arrecadação de impostos e outras receitas for menor do que o previsto, isso pode resultar em falta de recursos financeiros;
  2. Despesas Obrigatórias: Algumas despesas são obrigatórias por lei, como o pagamento de serviço da dívida externa, de pessoal, além de encargos sociais e benefícios da previdência social. Essas despesas, em princípio, têm de ser pagas independentemente da situação financeira do governo;
  3. Fluxo de Caixa: O governo pode ter compromissos que são devidos antes que as receitas sejam efetivamente arrecadadas, criando um descompasso entre o orçamento e a disponibilidade financeira, como já discutido;
  4. Restos a Pagar: Estes são compromissos assumidos em anos anteriores e que podem ser pagos no ano corrente ou em anos futuros, o que acaba afetando a disponibilidade financeira no exercício corrente;
  5. Contingenciamento: Em situações de desequilíbrio fiscal, o governo pode decidir contingenciar (bloquear) parte do orçamento, o que significa que, embora o orçamento tenha sido aprovado, a autorização para gastar é limitada para manter o equilíbrio fiscal;
  6. Execução Orçamentária: Outro problema recorrente é que nem todo o orçamento aprovado é efetivamente executado. Às vezes, projetos são adiados ou cancelados, o que também afeta a disponibilidade financeira.

Diante de todo o exposto, percebe-se que, no contexto brasileiro, é perfeitamente factível que o gestor público tenha autorização legal para executar sua parte do Orçamento Público Federal (definido na dotação orçamentária), mas que, por outro lado, não possa executá-lo, pois o governo não possui disponibilidade financeira (dinheiro/numerário) naquele momento.


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